sábado, 6 de fevereiro de 2016

Por quanto errei a sua nota?

Imagem obtida de: http://mikeyllo.com/blog/wp-content/uploads/2010/12/frustrated_student.jpg

Olá, queridos professores, alunos e interessados!

O ano de 2016, como se diz na gíria, “chegou com tudo”! A introdução da reflexão que trago hoje é resultado do que aconteceu comigo nos últimos dois meses, por isso contarei primeiro a minha história, e depois seguimos ao tema principal.

Ao final de 2015, fiz uma reunião com o meu coordenador, na faculdade (privada) em que dou aula, para pedir um merecido aumento. Nesta reunião, meu superior me surpreendeu com uma oferta de emprego que para mim foi irrecusável: tornar-me coordenador do mesmo curso (Engenharia de Controle e Automação) em uma outra unidade da mesma faculdade.

Fiquei muito surpreso com a oferta, afinal fazia pouco menos de um ano que eu era professor nesta instituição, e além disso, eu tinha (e ainda tenho) 29 anos. Depois entendi que, além de possuir graduação exatamente no mesmo curso, e de ter uma avaliação positiva dos meus superiores, algo que contou muito para o convite foi o fato de eu ser um dos poucos professores na instituição com título de doutor. Por isso, professores, invistam em um doutorado!

Depois do choque, comecei a me animar com a atividade de coordenação. Afinal de contas, estando um “degrau corporativo” acima, eu poderia propor certas mudanças que muito me afligiam como professor! Hoje, 26 dias depois de assumir o cargo, ainda estou me adaptando a muitas situações e demandas, e percebi que, de fato, será possível propor algumas ações que melhorarão a vida de alunos e professores.

Na instituição em que agora coordeno um curso, a média para aprovação em todas as matérias é de 6,0 pontos. Um dia desses, um aluno veio a mim para pedir uma revisão de nota, pois o professor o havia reprovado com 5,5. “Poxa, só por causa de meio ponto? É muito pouco, será que não dá pra rever?” – ele dizia.

Apesar de ser também uma diretriz da faculdade, o meu princípio diz que o professor é quem tem a autoridade sobre estes casos. Seu julgamento sobre o desempenho de cada aluno, ao meu ver, é soberano. Enquanto o aluno fazia seu apelo, do outro lado da mesa, eu acabei tendo um insight, que agora sim chega ao tema desta reflexão: será que uma nota numérica, ou mesmo por conceito (A, B, C, etc.) é o melhor instrumento de avaliação do aluno?

Fiquei pensando no caso do professor, fechando as notas desta matéria. Como é de praxe, nós professores sabemos que notas são instrumentos de avaliação subjetivos, e por isso sujeitos a erros difíceis de medir. Por isso, quando um aluno tem uma nota menor, mas muito próxima da média, é comum que reavaliemos os casos específicos e ajustemos a nota caso necessário. O professor, com toda a certeza, viu o caso do aluno e julgou que ele não estava apto a ser aprovado.

A diferença entre ser aprovado ou não, no caso deste aluno, não é “meio ponto”. A reprovação foi o resultado de um julgamento do professor sobre todas as ações daquele aluno naquele semestre. Ou seja, o aluno queria um “sim”, mas ganhou um “não”, o que são conceitos muito opostos, diferente da pequenez do “meio ponto” ao qual o aluno se referiu.

Contudo, a nota numérica traz uma ideia de “quantificação do saber”. Aparentemente, a percepção do aluno (como eu repito que um dia foi a minha) é que o esforço que ele fez no último semestre lhe rendeu 5,5 pontos. Com um pouquinho mais de esforço ele conseguiria 6,0 pontos e seria aprovado, ou seja, ele quase sabe tudo o que se deve saber sobre aquele assunto para ser aprovado.

Além disso, se o aluno for estatisticamente consciente, ele pode perguntar ao professor sobre qual o tamanho do erro que ele admite, ou ao menos estima, em sua avaliação. E aí, qualquer resposta que se pense estaria muito longe da correta, pois precisaríamos de milhões de alunos fazendo exatamente a mesma prova, e sendo avaliados exatamente segundo o mesmo critério para ter uma ideia. Isto com relação a cada avaliação.

É por isso que o julgamento do professor, no momento da decisão pela aprovação ou não aprovação do aluno, é um parâmetro muito mais razoável do que um conceito numérico. Mesmo com toda esta argumentação, não prego pelo abandono da nota numérica. Ela é uma métrica, ajustada por cada professor, para que se possa observar com certa clareza quais os alunos que deveriam ser, com toda a certeza, aprovados ou reprovados, e quais alunos precisam de uma maior atenção do professor para a aprovação. Em outras palavras, com a nota numérica é possível separar os alunos em três grupos: os aprovados, os reprovados e os alunos a julgar.

Porém, esta métrica é algo muito mais útil ao professor do que ao aluno. O fato é que, para um professor específico, fazer esta distinção utilizando um instrumento de avaliação e uma métrica é razoável. Contudo, uma questão importante é a subjetividade da nota mínima para aprovação, ou “nota de corte”. Já vi instituições que trabalham com nota de corte 5, 6 e 7. Contudo, a diferença numérica entre estas notas não significa muito.

Da mesma forma que o julgamento de cada aluno é uma questão subjetiva do professor, o julgamento da quantidade de conteúdo que equivale à nota de corte também o é. Levando em conta que sabemos que o conhecimento não é quantificável, se dois professores lecionarem a mesma matéria, o 5,0 de um pode equivaler a menos conhecimento do que o 5,0 do outro. Então, os alunos diretamente classificarão o primeiro professor como mais “fácil” e o segundo como mais “exigente”. Normalmente o segundo é agraciado com adjetivos de baixo calão.

Em algumas instituições, a nota (ou a média das notas) de cada aluno é utilizada para classifica-los e para ceder alguns benefícios a alguns e não a outros. Estes benefícios vão desde prêmios por desempenho até prioridade na matrícula em um determinado horário do curso.

Eu passei por isso durante a minha graduação na Unicamp. Sempre morei em Jundiaí, e ia de ônibus fretado para a faculdade. Como meu curso era noturno, conseguir a matrícula nas matérias oferecidas à noite acarretaria em menores custos para os meus estudos. A minha turma tinha 50 alunos, mas algumas matérias eram ministradas em laboratório, de forma que as turmas noturnas tinham apenas 15 vagas. Resultado: eu tinha que estudar bastante para estar sempre entre os 15 “melhores”, ou entre os 15 com as maiores médias, para conseguir minha matrícula.

No fundo, eu nunca tive problemas e sempre consegui minha vaga à noite. Porém, eu tinha sempre duas alternativas: ou me matriculava com o professor mais “fácil”, e como consequência aprendia “menos”, ou me matriculava com o mais exigente, e me comprometia a estudar mais. Como todo o bom “nerd”, sempre escolhi a segunda opção, mas passei por “poucas e boas” para conseguir os números desejados como nota.

Só depois de muito tempo, percebi que aqueles números que tanto busquei eram sim uma métrica, com todas as falhas que uma métrica pode ter, e que eles não eram capazes de quantificar o meu saber, e muito menos a minha capacidade como estudante e pesquisador. Creio que a única maneira de eu ter uma noção da grandeza das minhas capacidades, como ser humano, é fazendo uma autoavaliação, sempre muito crítica e honesta. Como engenheiro, eu digo que se nem uma grandeza vetorial não é capaz de me descrever, imagine uma grandeza escalar!

Mas esta não é a mensagem que estamos passando aos nossos alunos. Atribuímos a ele, ou a seus fazeres uma nota, e esta nota deve classifica-lo, portanto é capaz de quantifica-lo naquela que é a única atividade pela qual parecemos nos importar: a habilidade de responder corretamente uma quantidade massiva de questões.

Creio que valha muito a pena trabalharmos na conscientização do aluno, sobretudo no que diz respeito à autoavaliação das capacidades e do conhecimento adquirido. Queremos que o nosso aluno saiba dizer se aprendeu ou não aprendeu um determinado conteúdo muito antes de ser avaliado. Somente esta percepção será capaz de alimentar o seu bom senso e a sua procura pelos conhecimentos que de fato lhe faltam, evitando assim horas de estudo que não o levarão ao desenvolvimento concreto de seu conhecimento.


São perguntas básicas, que não ensinamos nossos alunos a se perguntarem, muito menos a responderem honestamente. “O que eu ainda não sei?”. “Por que eu não estou entendendo?”. “O que o professor espera que eu saiba?”. “O que eu preciso saber para compreender e dominar este assunto?”. “Qual conhecimento específico me falta para que eu consiga aprender este conteúdo?”. O aluno que aprende a se perguntar e a responder honestamente a estas questões, é automaticamente capaz de aprender com qualidade qualquer assunto. Não é isso o que queremos?

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