terça-feira, 27 de outubro de 2015

Qual é o segredo para ser bom em Matemática?



Olá, pessoal, tudo bem?

Este post é uma tradução que eu mesmo fiz de uma reportagem publicada no site theconversation.com em 22 de outubro de 2015 e escrita por dois autores: Steson Lo, aluno de doutorado na Universidade de Sydney (Austrália), e Sally Andrews, professora de Psicologia Cognitiva na mesma universidade.

Talvez este seja um dos poucos textos sobre educação com o qual eu concordo do início ao fim. Por isso, dei-me ao trabalho de traduzi-lo, ainda que à moda própria para o Português. Se o leitor lê em inglês, pode acessar o texto original em http://theconversation.com/what-is-the-secret-to-being-good-at-maths-49222.

Abaixo você encontrará a reportagem traduzida e a seguir meus comentários sobre ela. Divirta-se!

TRADUÇÃO: Qual é o segredo para ser bom em Matemática?
Traduzido por: Vinícius Simionatto

Há um senso comum de que os Asiáticos possuem um dom natural para Matemática.
Países asiáticos como Singapura e Japão lideram os rankings de desempenho em Matemática em primeira e segunda posição, nas estatísticas do Programa Internacional de Avaliação Estudantil (do Inglês, PISA) – uma pesquisa internacional que compara sistemas educacionais mundialmente – enquanto a Austrália se encontra próxima da 12ª posição.

Qual é o segredo para ser bom em Matemática? Você simplesmente nasce inteligente ou seria o resultado de muito trabalho duro?

Para compreender as razões por trás do desempenho excepcional em Matemática, eu (um dos autores originais) viajei para o Japão para entender como crianças japonesas são capazes de multiplicar instantaneamente números de três ou quatro dígitos “de cabeça”.

Como se ensina Matemática para crianças no Japão

Desde os 7 ou 8 anos, todas as crianças Japonesas aprendem a canção da tabela de multiplicação kuku. “Ku”, em Japonês, significa “nove”, e o título reflete a última linha da canção, que é simplesmente “nove nove (é) oitenta e um”.

As crianças memorizam a canção e devem recitá-la com velocidade em classe e em casa.
Competições locais colocam crianças de segunda série frente a frente para ver o quão rápido elas conseguem cantar as 81 linhas do kuku.

Isto requer muito treino e um cronômetro. A associação constante entre o problema e a resposta correta, depois de algum tempo, permite que a criança saiba a resposta do problema no momento em que o veja.

Como dito pelo popular escritor sobre ciência, Alex Bellosnoted, adultos japoneses sabem que 7x7=49 não porque se lembram da Matemática, mas porque a música “sete sete quarenta e nove” soa correta.

Algumas crianças japonesas também assistem a aulas de Matemática após a escola. Em maio, visitei (o autor original) uma escola em Tóquio especializada em ensino de como usar o ábaco para alunos dos ensinos fundamental e colegial. Era uma entre 20.000 escolas operando independentemente no Japão.

Nela, os alunos começam aprendendo como usar o ábaco físico para fazer operações matemáticas. Eles então avançam para o uso do ábaco mental, apenas imaginando o movimento das peças.

As crianças em escolas de ábaco dedicam incríveis uma a duas horas, de duas a quatro tardes por semana, na prática de operações matemáticas em listas de exercícios pré-estabelecidas, e em velocidade.

Isto vai além dos 45 minutos semanais de aula de Matemática alocados pelo governo japonês.

Após poucos anos neste tipo de escola, os melhores alunos são capazes de multiplicar números de 7 a 8 dígitos “de cabeça” mais rápido do que crianças australianas encontram a solução de 7x8.

Por que escolas australianas são contra a memorização?

Apesar do desempenho impressionante das crianças japonesas, a abordagem intensiva utilizada pelas escolas de ábaco é desvalorizada em países como a Austrália, onde os educadores desencorajam explicitamente o uso desta prática.

Em Victoria, recentemente as escolas foram encorajadas a jogar fora livros texto e tabelas antigas, professores foram desestimulados a ensinar fórmulas matemáticas, e as crianças foram desestimuladas a aprender a tabela de multiplicação por memorização.

Estas recomendações seguem das ideias do fisiologista americano Jerome Bruner, que afirma que o aprendizado é mais eficaz quando a criança descobre ativamente os conceitos, por si própria.

Desde então, entende-se que métodos de aprendizado por memorização nos quais as crianças passavam a maior parte do tempo memorizando fatos, seguindo fórmulas prescritas e completando exercícios, contribuem muito pouco para o profundo conhecimento matemático.

Contudo, pesquisas mais recentes sugerem que técnicas que utilizam a memorização ainda são importantes em sala de aula.

De acordo com o fisiologista cognitivo Daniel Willingham, as crianças não conseguem absorver a relação entre os conceitos matemáticos se todos os seus recursos mentais precisam ser utilizados para executar operações matemáticas simples.

Conforme a dificuldade dos problemas aumenta, a prática e a memorização são essenciais na aceleração de algumas destas operações, para que elas se tornem automáticas. Isto permite às crianças dedicar uma maior parte de seus recursos cognitivos na compreensão de questões de mais alto nível.

Infelizmente, a prática repetitiva nem sempre é divertida.

Um dos motivos pelos quais os educadores se desencorajam de utilizar estas técnicas é o fato de elas debilitarem o comprometimento e a motivação das crianças.

A motivação para o sucesso

Por outro lado, as crianças japonesas das escolas de ábaco gostam de fazer contas rapidamente.

Muitos deles encaram o cálculo mental como um esporte e participam de várias competições locais, regionais e nacionais. E estas competições não são restritas a meninos. Eu (o autor original) fui a uma competição para garotas jovens enquanto estive no Japão.

Isto contrasta com uma crescente cultura de evitar a competição na Austrália, onde as crianças são isoladas das realidades do fracasso, bem como das glórias do sucesso.

Na política da Liga Australiana de Football (diferente do futebol brasileiro) Júnior, por exemplo, crianças inferiores a 10 anos agora jogam sem pontos, placares, e sem premiação por desempenho individual.

A remoção destes instrumentos objetivos de desempenho deixa as crianças sem um objeto de disputa. 

Quando a paixão cria o talento

Estrelas são feitas, não nascem prontas. Pesquisas mostram que são necessárias pelo menos 10.000 horas de treinamento intenso para alguém se tornar especialista em determinada área. Os bem-sucedidos em Matemática alcançam este número de horas pois são motivados a se destacar.

Mas treinamento deliberado é um trabalho duro. Desde tempos cada vez melhores em se recitar o kuku até extensos problemas matemáticos mentais, minhas observações no Japão mostram que as crianças japonesas usam a competição para alimentar sua paixão por matemática.

Este nível de competição faz falta na Austrália.

Métodos baseados em descobertas para o ensino de Matemática podem ser mais agradáveis, mas são menos eficientes na produção de desempenho rápido e preciso em nível de elite.

Como podemos encorajar os Australianos a compartilhar da paixão asiática por competições matemáticas?

Na China, o game show televisivo Super Brain atraiu 22 milhões de espectadores em março, quando os competidores disputavam na solução de problemas aritméticos de dificuldade crescente.

Dado o sucesso recente do programa The Great Australian Spelling Bee (do Inglês, “A grande abelha australiana da soletração”) em gerar novos interesses em soletração, talvez o que precisemos agora é “A grande tabela de tabuada australiana” para motivar as crianças a alcançarem os mesmos níveis de desempenho matemático de nossos vizinhos asiáticos.

FIM DA REPORTAGEM

Depois de um longo texto, se o leitor atingiu estes comentários que farei agora, creio que sua atenção foi despertada, como a minha.

Em primeiro lugar, acho fantástico o interesse destes australianos em outras culturas, para que possam melhorar o ensino das próprias crianças. Poucos são os educadores e pesquisadores brasileiros que possuem estas tendências, e talvez os que possuem não sejam valorizados o suficiente. Nós, brasileiros, precisamos desesperadamente de ensino, ensino de qualidade, que nos ajude a desenvolver nosso povo (não só as crianças), e precisamos dispor de quaisquer meios para tanto.

Dado este comentário, os educadores e pais que estejam lendo este texto devem ter notado que em nosso país há uma tendência em se seguir (não discutamos as formas ainda) os ensinamentos do Dr. Jerome Bruner. Um exemplo disso é o fato de nossas escolas públicas não ensinarem mais a tabuada (o kuku brasileiro).

Tanto na Austrália quanto aqui, eu vejo que o que está sendo adotado é uma completa distorção dos estudos e conclusões do Dr. Bruner.

Para mim é evidente que, quando se descobre por conta própria um conhecimento, o aprendizado torna-se muito mais eficaz. Ainda mais quando se possui uma necessidade direta por aquele conhecimento. Porém, este processo toma tempo, e os conhecimentos básicos (como a tabuada) têm uma data para serem absorvidos. É inaceitável que uma criança no nono ano tenha dificuldades na realização de multiplicações, na leitura e na escrita, como é o que encontramos no Brasil.

Uma criança no quarto ano do ensino fundamental deveria com facilidade realizar multiplicações de números inteiros de três a quatro dígitos, escrever e ler, com compreensão, textos de média dificuldade. Não se pode esperar que esta criança atinja a maioridade penal para que ela sinta a necessidade de aprender a ler e fazer contas, e só então o faça. Isto é um absurdo!

Outro fato que me causa estranheza é a forma com que os métodos mais tradicionais são tratados. É evidente que não é divertido passar a tarde toda fazendo lição de casa, exercícios e tarefas repetitivas.

Não é divertido, mas também não dói!

Eu mesmo passei inúmeras tardes de minha vida estudando. Eu inclusive, alienígena que sou, fazia tarefas além das pedidas pela professora. Fazia resumos das matérias no computador, elaborava exercícios, lia outros livros, etc. Tudo isso contribuiu de forma quase imensurável (de tão grande) em minha formação. Além disso, eu fazia tudo isso porque gostava.

É evidente que eu não era uma criança comum. Contudo, existe um nível básico de formação, que todas as crianças deveriam atingir, e que hoje, talvez as das melhores escolas atinjam. Talvez. Mas basta que as escolas e famílias tornem o estudo tradicional mais prazeroso. Não é necessário jogar tudo o que temos no lixo e começar de novo! Basta adaptar! O Japão, por exemplo, encontrou esta alternativa nas competições.

Por estes motivos, meu comentário lá no início: eu não poderia concordar mais com este texto.

Deixe seu comentário, sua opinião, ajude a divulgar meu trabalho, e com trabalho de formiguinha mudaremos o nosso Brasil.

Um grande abraço e até mais!


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